domingo, 5 de dezembro de 2010

Caligrafia

Dia desses, num programa de televisão, havia uma reportagem sobre uma venda no interior de Minas que havia sido fundada em 1894 e até hoje funciona. Quando mostraram aquilo que funcionava como um livro caixa no princípio do negócio, eu e meu marido ficamos encantados com as letras que marcavam as páginas daquele singelo livro. Que letra linda!
Em 18 de dezembro de 1894 a esposa do proprietário pôs-se a tomar conta do livro e jamais imaginou que em 2010 esse mesmo livro seria mostrado pela TV.
Não sei como era essa mulher, se feia ou bonita em suas feições, mas é certo que sua letra é maravilhosa. Ela, certamente, já partiu dessa para melhor, mas sua letra permanece e de algum modo, me encantou.
As reviravoltas no desenho cuidadoso de cada letra deixam-me boquiaberta com tamanha habilidade. As letras não me saem da cabeça.
Lembrei-me da professora da quarta-série, ainda em São Paulo, que pegou no meu pé por causa de minha letra-garrancho.
Zarife Ale. Mulher brava, séria, exigente.
Decidiu colocar-me em aulas de caligrafia, que ela dava umas duas vezes por semana, no período da tarde, na própria escola.
Eu fiquei muito brava na época, obviamente. Que diferença poderia fazer minha letra?
Os médicos não são a prova final de que a gente pode ir longe com uma letra feia???
E lá se foram tardes e tardes sob a tutela de Profª Zarife. Um dia, enfim, ela disse que já estava bom e liberou-me daqueles caderninhos com suas linhas diferentes.
Já na faculdade, soube que a esposa de um professor o ajudava a corrigir as provas e sabia de longe qual era a minha prova. Pela letra.
Há alguns anos, procurei a Professora Zarife e mandei-lhe uma carta de gratidão pelas letras que ela me ensinou. Tardes sem fim para um aprendizado eterno.
Ela ficou feliz e muito surpresa, afinal, qual aluno agradece a seu professor? (Deveríamos fazer mais isso, não é?)
O tempo me ensinou que uma letra bonita dá beleza aos bilhetes, às cartas e mais que isso, é respeito com quem lê o que está escrito. Escrita é comunicação em forma sólida, se é feita para a leitura de outrem, deve ser cuidadosa, clara, bonita para conseguir comunicar como se deve.
Infelizmente, muitos cheques são preenchidos às pressas e ficam com a letra feia; muitos bilhetes são deixados de última hora, sem que haja cuidado com a letra, cadernos são forrados de informações em letras deploráveis. Triste.
Podemos colocar flores em nossas letras, enfeitar mais, ter mais cuidado e respeito com quem nos lê, ter carinho com o papel e com a caneta...
Quem sabe possamos ser como a boa esposa do interior de Minas que me tocou, sem nem estar aqui, por causa de sua bela letra.

Um comentário:

  1. Adorei seu texto.
    É impressionante como você consegue escrever sobre os mais variados temas, fazendo com que a leitura sempre seja agradável e muito divertida.
    Boa sorte com seu novo Blog.
    Beijos
    Leandro

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